Artigo publicado na Revista Com-Ciência Negra. CECIP, O Estudio, Rio de Janeiro, 01/2011.
Por Madza Ednir e Dinah Frotté (1)
Colaboração: Claudius Ceccon, Débora Macedo e Roberto de Sá (2)
Ao entrarmos na segunda década do século XXI, em plena crise ética, econômica e ambiental, vemos por toda parte indícios do fortalecimento de valores tradicionais da Mãe África, como o respeito pela força sagrada da Vida em todas as suas manifestações e a consciência da solidariedade básica entre todos os humanos, por mais diferentes que sejam. Saiba o que é Educação Global e como um Currículo Global para a Sustentabilidade começa a ganhar forma também no Brasil.
1- Seres Humanos: cidadãos planetários por natureza?
Há cerca de 7 milhões de anos, no vale da Grande Fenda, que atravessa a Tanzânia, o Quênia e a Etiópia, a espécie humana começou a se diferenciar dos outros primatas. Muito tempo depois, homens e mulheres partiram da África e povoaram os outros continentes: foram os precursores da planetarização... Deixando o berço africano, alcançaram regiões que mais tarde nomeariam como Egito, Mesopotâmia, Índia, chegando à Europa, à China e de lá à Oceania e às Américas. Nesses territórios, criaram as primeiras civilizações. Mas, na longa travessia, iniciada há trezentos mil anos, a lembrança de sua origem se apagou. Esqueceram–se de que eram membros da mesma família – a humanidade. Essa memória, no entanto, permaneceu viva no inconsciente coletivo, refletindo-se em ideias, sonhos, mitos comuns. Imagens que se repetiram com regularidade, em diferentes variações, nas culturas tradicionais dos cinco continentes, que por milênios permaneceriam isolados: a árvore da vida; a água que dissolve e cria; a serpente cósmica; o touro ou o boi sagrados; o círculo como símbolo de harmonia, unidade, perfeição...
Durante séculos, civilizações humanas permaneceram ignorantes umas das outras, até que o espírito de aventura e a necessidade de conquistar novos territórios e de comerciar começaram a abrir rotas entre elas. Mapas do mundo puderam então ser desenhados e sucessivamente aperfeiçoados por gerações de cartógrafos. E, no século XV, graças à audácia e interesses expansionistas dos portugueses e espanhóis que se lançaram a mares “nunca dantes(por eles) navegados”, o processo se completou. Nos mapas, as antigas Terras Incógnitas foram identificadas como as Américas.
Os continentes se interligaram, mas seus habitantes não se re-uniram. Civilizações como as Inca, Azteca e Maia, ricas culturas Africanas e indígenas foram espezinhadas . As leis do mercado predominaram sobre as do humanismo de um Montaigne (“Todos os homens são meus compatriotas”) ou de um Erasmo de Rotterdam (“Sou homem e nada do que é humano me é estranho”). A ordem comercial se agigantou até culminar no capitalismo selvagem global e excludente. Embora, ao longo dos séculos, em todas as partes tenham se erguido vozes relembrando a fraternidade entre os humanos e entre eles e os demais seres do planeta - como as de Gautama Sidarta na Índia, Jesus de Nazaré na Palestina, ou Francisco de Assis na Europa- a globalização, até hoje, vem sendo norteada pela ânsia do lucro e pelo individualismo, fazendo com que indivíduos, grupos e nações tratem-se uns aos outros como objetos e estejam em constante competição por espaços e recursos.
O mercado, triunfante em nível mundial, não fez desaparecer a pobreza e aprofundou o fosso entre ricos e pobres. Como diz Jacques ATTALI, (Uma Breve História do Futuro, E. Novo Século, 2008), nesse contexto, ”... cada um se torna o rival de todos. Conflitos locais se multiplicam, as vidas não têm mais valor (...). A democracia se torna uma ilusão quando os mais ricos concentram em suas mãos o poder de entreter, vigiar, orientar, decidir. A democracia de mercado não é senão uma gigantesca fraude moral. O chamado progresso baseado no individualismo destruiu a natureza e as bases de sobrevivência da humanidade”.
2- Globalização e Planetarizaçâo
Não haverá, então, esperanças para a nossa espécie, e nosso destino inexorável será sucumbir à catástrofe ambiental, à guerra nuclear ou *......... mundo está sendo!. (Pedagogia da Autonomia, p. 85)
A verdade é que a ordem comercial e a globalização predatória estão em crise, o que representa uma oportunidade única de mudança. A partir de meados do século XX, no marco da Declaração Universal dos Direitos Humanos, forças novas, de coesão e solidariedade entre todos os habitantes do planeta – embora ainda tão discretas que mal são percebidas diante da estridência do capitalismo destruidor , da xenofobia e do belicismo - começam a operar com intensidade crescente. À crença em um desenvolvimento sem limites, contrapõe-se a noção de sustentabilidade; a Economia Solidária surge como alternativa à Economia capitalista dominante , promovendo a cooperação entre pessoas, famílias, comunidades e países. O comércio justo começa a ser praticado a nível regional e internacional. Milhões aderem aos princípios de uma vida simples, ao consumo responsável, às formas de economia relacional onde se produzem e trocam serviços gratuitos. Multiplicam-se as cooperativas, onde, em vez de patrões e empregados, chefes e subordinados, há participação coletiva nas tomadas de decisão, com ganhos e perdas igualmente compartilhados. Diante da guerra sem fim entre islâmicos , cristãos, judeus e palestinos, os primeiros adeptos do conceito de Ecumenismo- eles existem, pasme, também na Palestina e em Israel, nos Estados Unidos da América e nos países árabes- propõem o apaziguamento das grandes Religiões do Livro, além de resgatar as Religiões Africanas, antes consideradas pelos europeus como meras superstições. A cultura da Paz e da transformação de conflitos expande-se e infiltra-se nos sistemas de justiça e educação, com práticas de Justiça Restaurativa substituindo procedimentos punitivos, baseados na retribuição do dano causado. A Internet, que em menos de quatro décadas de existência conectou pessoas e cidades de ponta a ponta do planeta, proporciona formas de mobilização política e cooperação intelectual nunca dantes imaginadas.
Considerar essas novas – e ainda incipientes- dinâmicas, é admitir a possibilidade de um cenário alternativo ao de uma humanidade que se autodestrói pelo consumismo, intolerância à diversidade e belicismo.
Pessoas de todas as condições, nacionalidades e culturas acreditam, como ATTALI, que “nosso mundo pode tornar-se uma democracia planetária tolerante, pacífica, diversa, porém reunida, onde cidadãos planetários serão hospitaleiros e respeitosos do mundo, altruístas, longe do egoísmo e do desejo de destruir, percebendo que não são proprietários da Terra, mas só tem o seu usufruto. Eles terão a fraternidade como ambição, e encontrarão a felicidade no prazer de dar prazer, em particular às crianças pelas quais são responsáveis”. Organizações como Cruz Vermelha, Greenpeace, Médicos Sem Fronteiras, World Wild Fund, Creative Commons e tantas outras, além de embriões de instituições de governo planetário como ONU e Unesco, já se pautam por essa ética.
3- Africanidade e valores planetários
As imagens da África que dominam na mídia nos mostram um continente devastado por conflitos, doenças, pobreza extrema . Grande parte desses problemas da desgraça da colonização, negadora de direitos e humanidade. Além disso , vitoriosos os movimentos de libertação, a corrupção, em governos das mais diversas regiões do planeta- instalou-se também na maioria dos países na África. No entanto, a Mãe África de Leopold Segnhor, Jomo Keniatta, Mandela e tantos outros é maior que todos os seus problemas e há valores básicos que sustentam milhares de micro-iniciativas africanas bem sucedidas ( e muito pouco divulgadas) no sentido de enfrentá-los de forma autônoma e responsável.
No ano de 2011, instituído pela ONU como o Ano Internacional do Afrodescendente, é bom lembrar que as forças altruístas e universalistas, atuantes a nível local e global, são também tributárias de valores e princípios tradicionais africanos. Nesse sentido, representam um início de retorno às origens- uma reconciliação da humanidade consigo mesma.
Autores como Kabenguele MUNANGA (Origens Africanas do Brasil Contemporâneo, E. Global, 2009) e Azoilda Loretto TRINDADE, (Ensino Fundamental: um novo olhar sobre o pluralismo cultural, SME-SP, 2008, acreditam que, a diversidade africana – 56 países, cerca de duas mil línguas –convive com aspectos comuns que subjazem à multiplicidade de culturas. Essa comunidade de valores, percepções e práticas – a Africanidade – pode ser observada nos mais diversos pontos das regiões abaixo do Saara. São princípios que se assemelham de forma impressionante, àqueles acima descritos, anunciadores da cidadania planetária do futuro:
- Axé, Energia Vital: É generalizada a crença na Força Vital que irriga o universo: “tudo o que existe e é vivo possui axé, energia vital- planta, água, pedra, gente, ar, bicho, tempo, tudo é sagrado e está em interação” (TRINDADE). Essa crença fortalece o respeito ao outro e à vida, inclusive a do planeta.
- Circularidade - a roda como porta para o fortalecimento da coletividade. No passado, a democracia africana baseava-se na construção do consenso: a tomada de decisão acontecia por meio de longas horas de discussão em círculo sob uma árvore, até se conseguir unanimidade.
- Ludicidade - alegria, gosto pelo riso, celebração da vida por meio da música e da dança, com ausência da noção de culpabilidade ou de pecado original.
- Cooperatividade - cultura do plural, do coletivo, da cooperação, com forte consciência da primazia do coletivo sobre o indivíduo.
Esse último princípio encontra sua tradução mais perfeita no conceito tradicional de Ubuntu, palavra de origem banto que tem sido traduzida como “Eu sou o que sou por aquilo que todos somos” (Lia DISKIN), ou como a crença no compartilhamento que conecta toda a humanidade. Essa crença está no fundamento do provérbio africano “É preciso uma aldeia para se educar uma criança”, sempre citado quando se fala nas Cidades Educadoras, onde todas as agencias sociais, e não apenas as escolas, tem consciencia de sua responsabilidade na formação das novas gerações.
4- Uma Educação para a Cidadania Planetária
O ano de 1992, quando se realizou a Conferencia Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento Rio 92 – a Cúpula da Terra – marcou o surgimento de iniciativas para sintonizar a Educação à exigência de se fortalecer, nas crianças e jovens de todas as nações, a consciência de que somos Ubuntu, compartilhamos a mesma humanidade. Nessa ocasião, foi aprovada, por representantes do mundo inteiro - mais de mil e trezentas ONG - a Carta da Terra. Nesse documento, os signatários se comprometem a “construir sociedades democráticas, justas, participativas e sustentáveis e democráticas, adotar padrões de produção, consumo e reprodução que protejam as capacidades regenerativas da Terra, os direitos humanos e o bem estar comunitário, erradicar a pobreza como imperativo ético, social e ambiental, promover uma cultura de tolerância e não violência”, além de “integrar na educação formal e no aprendizado ao longo da vida inteira, os valores e as habilidades necessárias para se ter uma forma de vida sustentável. (Moacir GADOTTI, A Carta da Terra na Educação, Es,L, 2010)
A partir daí o Instituto Latino Americano de Pedagogia da Comunicação, da Costa Rica, lança os conceitos de Ecopedagogia e Cidadania Planetária, sistematizados por Francisco Gutierrez e Cruz Prado.
No Brasil, o Instituto Paulo Freire, por meio de Angela ANTUNES e Moacir GADOTTI, passa a disseminar e desenvolver esses conceitos, influenciando a prática de escolas públicas em municípios como S. Paulo e Osasco, dentre outros. Para GATDOTTI e ANTUNES, “A noção de uma cidadania planetária sustenta-se em uma visão unificadora do Planeta e de uma sociedade mundial. Ela se manifesta em expressões como Nossa Humanidade Comum, Nosso Futuro Comum, Nossa Pátria Comum. Tem a ver com a consciência de que somos habitantes de uma única morada, de uma única nação. Temos uma identidade Terrena, somos terráqueos”.
Enquanto isso, na Europa, a Educação para Cidadania Planetária do Hemisfério Sul é denominada Educação Global. A Declaração de Maastrich (2002) define Educação Global como “a educação que abre os olhos e as mentes das pessoas para a s realidades do mundo globalizado e as desperta para construir um mundo de maior justiça, equidade e direitos humanos para todos. Falar de Educação para a Sustentabilidade, Educação para a Paz e Transformação dos Conflitos, de Educação Intercultural, é falar de Educação Global. Educação Global é a dimensão global da Educação para a Cidadania”.
A Educação Global já se tornou uma política pública da União Europeia, incentivada por meio dos Centros de Educação Global, que apoiam escolas e agencias educativas não formais, na implementação de processos de aprendizagem transformadora, estimulando o trânsito de uma cultura do individualismo, associada com a dominação, para a uma cultura da parceria baseada no diálogo e na cooperação entre indivíduos, povos, culturas. Pretende-se renovar os currículos escolares, desenvolvendo nos aprendizes competências para criar novas formas de pensar e de agir em uma sociedade globalmente interconectada, rumo a um futuro sustentável.
Para incentivar mudanças no nível local que influenciem o global, as escolas são convidadas a utilizar métodos participativos, integrando movimentos sociais e processos de aprendizagem não formal a processos educativos formais. A metodologia da Educação Global na Europa tem muitos pontos de contato com a abordagem freireana de leitura do mundo. Parte-se de um problema do momento presente e retorna-se ao passado para analisar a sua história, a sua gênese-e, então, levantam-se alternativas de ação que podem moldar o futuro. Os educadores ajudam os estudantes a fazerem a ponte entre o problemas em um micro contexto e a dimensão global, indo da realidade mais próxima - a família, a vizinhança, a escola, a cidade- para a realidade intermediária I a região, o estado. E daí, para a realidade mais ampla (o planeta). Investigam-se as relações entre o micro e o macro, compartilham-se ideias sobre possíveis soluções e parte-se para a ação.
A Educação Global para a Sustentabilidade propicia, assim, a aprendizagem de conhecimentos, habilidades, valores e atitudes.
Conhecimentos: conceitos e conteúdos da programação normal, enriquecidos por informações sobre processo de globalização, desenvolvimento da sociedade planetária, princípios e acordos globais, pontos comuns e diferenças entre culturas e conceitos que expressam a dimensão global/planetária como os de Justiça social, Cultura de Paz, Economia Solidária, Comércio Justo, Cidadania, Diversidade e outros.
Habilidades: Pensamento crítico, perspectiva múltipla (saber olhar a mesma situação sobre diferentes pontos de vista); reconhecimento de estereótipos e preconceitos; empatia para com os que pertencem a diferentes grupos, culturas e nações; diálogo, assertividade (afirmar-se sem ser agressivo), compreensão da complexidade, das contradições e da incerteza; manejo e transformação de conflitos.
Valores e atitudes: autoestima, autoconfiança, autorrespeito e respeito pelos outros; Responsabilidade social; Responsabilidade ambiental; Mente aberta; Atitude Visionária; Pertencimento comunitário participativo e proativo.
5- Um Currículo Global para a Sustentabilidade, a Democracia e a Diversidade
Em plena Década da Educação para o Desenvolvimento Sustentável (2005-2014), quase na reta final do período de acompanhamento e cobrança pela realização dos ODMs (Objetivos de Desenvolvimento do Milênio) que se encerra em 2015, educadores brasileiros e de mais quatro países, em 40 escolas, mostrarão como um currículo significativo pode contribuir para que os estudantes e comunidade desenvolvam atitudes e práticas cidadãs, ecorresponsáveis, com impacto na melhoria da qualidade de vida, na comunidade, na cidade, numa perspectiva planetária. Trata-se do Projeto Currículo Global para a Sustentabilidade, financiado pela União Europeia e desenvolvido por ONGs da Áustria (Südwind, líder internacional); do Benin (Nego-Com), do Brasil (CECIP), do Reino Unido (Leeds DEC) e da República Checa (Arpok), em cooperação com as autoridades educacionais de cada país.
Um Currículo Global deve estar afinado com os princípios e metodologias acima descritos, voltando-se à construção de uma cidadania planetária, onde os conceitos de justiça social, sustentabilidade, interdependência/solidariedade entre países dos hemisférios Norte e Sul , estão embutidos nas aulas de todas as disciplinas. Assim, o desafio dos 800 professores participantes - 100 deles no Brasil, com liderança de 25 - consiste em examinar as programações de suas disciplinas e identificar oportunidades para relacionar os conteúdos já estabelecidos aos conceitos que expressam a dimensão global/planetária , produzindo Planos de aula, Sequências Didáticas e Projetos interdisciplinares , que culminem em ações rumo à justiça social , ao incentivo do comércio justo, do consumo consciente, da tolerância e respeito às diferenças, da preservação do ambiente. Com esses materiais, o coletivo internacional de docentes. construirá um Modelo de Curriculo Global on line, multilíngüe,
Um Modelo para apoiar e subsidiar docentes da Austria, Benin, Brasil, Reino Unido e República Checa , que desejam ensinar a dimensão global/planetária . No Brasil, contribuirá para que os conceitos de Justiça Social, Direitos Humanos, Sustentabilidade, Diversidade, Cultura de Paz e Transformação de Conflitos, Cidadania Global, deixem de ser tratados de forma periférica, em eventos, e passem a inserir-se de forma processual no corpo da programação das diferentes disciplinas . Isso tornará o currículo mais significativo, integrado à realidade, capaz de promover aprendizagens poderosas, com incremento da qualidade da educação.
Outra característica inovadora do Projeto é o diálogo horizontal entre professores de três continentes ,ligados a escolas as mais diversas- públicas e privadas , grandes e pequenas, laicas e religiosas- por meio da Internet e em Visitas de Estudo dos quais participam representantes das 40 escolas participantes.
A primeira Visita ocorreu entre 11 e 16 de Outubro de 2010 em Leeds, no Reino Unido, cidade onde os conceitos de Comercio Justo, e Convivência com a Diversidade já fazem parte do cotidiano. Cinco escolas foram visitadas , com observação de ambientes educativos e de práticas diretamente ligadas á realização de uma cidadania planetária.
Nessa ocasião, professores brasileiros puderam aprender e ensinar. Por exemplo, Isa Mello, da Escola Estadual Julia Pantoja, mostrou como os alunos construíram de forma interdisciplinar, com liderança do professor Roberto , de Artes, projetos de casas sustentáveis, e Sérgio Ferreira, da Teia/ Politeia, mostrou aos participantes como usar uma aula de Capoeira para despertar a Africanidade dos estudantes. O representante da EMEF Guilherme de Almeida , Eduardo Villalpando, trouxe consigo um exemplo de como trabalhar Sentimentos e Afetos na construção de uma cultura de Paz e de um projeto interdisciplinar coordenado pela professora de Português Débora Macedo , onde se parte-se do problema do mal-uso dos espaços públicos , para se discutir sustentabilidade e justiça social.
A segunda Visita de Estudos ocorrerá em Outubro de 2011, ao Benin, onde os participantes poderão vivenciar os princípios da Africanidade que impulsionam a construção da democracia planetária que desejamos.
A colaboração entre professores do Norte e do Sul do planeta contribui para desfazer antigos estereótipos e preconceitos cristalizados ao longo de séculos de colonialismo. Para os docentes e estudantes brasileiros , a presença do Benin nesse Projeto é um presente maravilhoso e uma grande oportunidade de incrementar a autoestima das crianças e jovens, em especial os afrodescendentes . Afinal , grande parte de nossos ancestrais vieram do antigo Reino do Daomé, trazendo consigo valores , crenças e princípios das culturas Fon, Ewé, Iorubá e Fulani, que tornaram o Brasil o país musical, dançante, criativo, espiritual, alegre e resiliente que é.
7- Cinco escolas brasileiras vivenciando a diversidade e outros conceitos da Dimensão Global/ Planetária
No Brasil ,o CECIP decidiu, por razões financeiras e estratégicas, oferecer o Projeto Currículo Global para a Sustentabilidade a escolas da Grande S. Paulo , cujos Projetos Político Pedagógicos já contemplassem, na prática cotidiana, a formação para a cidadania ativa e a sustentabilidade. Para tanto, foram contatadas a Secretaria de Estado da Educação de São Paulo , por meio da Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas e a Secretaria Municipal de Educação e São Paulo , por meio da Chefia de Gabinete. As autoridades educacionais apresentaram o Projeto a dirigentes e diretores interessados e três escolas públicas foram escolhidas, por contar com o maior número de docentes que já inseriam conceitos globais em suas aulas , dispostos atuar de forma voluntária , tendo como recompensa o prazer de criar algo novo e contribuir para a melhoria da educação brasileira. As escolas públicas de excelência selecionadas e seus diretores são: EMEF Guilherme de Almeida ,( Angela Bellinatti) ; EE Prof. Julia M Pantoja (Monica Cavalcanti) e EE Luiza Hidaka ( Arnaldo Teixeira). A elas se juntaram duas escolas particulares de excepcional qualidade ,com as quais o CECIP já desenvolvera parcerias : o Colégio Bandeirantes (Mauro Aguiar) e a Escola Teia/Politeia (Georgya C. Correa, Rosa Bertholini, Carolina Sumiê).
Em torno do propósito de se construir um Modelo de Currículo Global para a Sustentabilidade no Brasil, uniram –se mais de 25 educadores interessantes e interessados, cada um com um talento e uma história única , uma habilidade especial, disposto a trocar e compartilhar essa riqueza , para produzir em comunhão ações transformadoras . Assim , temos especialistas em Português- Débora M.Macedo, Laura Nogueira, Lenira A. Buscatto, Marlene P. Campos, Neuza Fabro,Rosangela Mainente; em Inglês- Eduardo Villalpando e Valeria Lopes; em Artes- Cleide Lopes e Roberto de Sá; em Educação Física - Daniela C. Lastoria e Sergio Ferreira; em História e Geografia - Denise M. Pires, Lucia Mitiko Hirata ,Sueli Nonato; em Ciencias, Ana Paula Zilla, Cristiana Mattos Assumpção, Rogério Fagundes Filho, Rosmeire Giacomelli , em Matemática- Isa C. de Mello, Osvaldo de Souza, Paula C. Rabello ,Suzana Hosomi ; em Multi/Interdisciplinaridade-Vera Lucia Tavares , Glaucia Palmieri.
Esse grupo encontrou-se presencialmente pela primeira vez em Agosto de 2010 , e, desde setembro, vem se comunicando via Internet, para afinar seus instrumentos. Um processo riquíssimo e desafiador , que possibilita a aprendizagem profissional cooperativa entre docentes de diferentes idades, gêneros, formação, religiões , personalidades, atuando nos sistemas público e particular de ensino.
Em 2010, primeiro ano do Projeto Currículo Global para a Sustentabilidade, dedicado à identificação das escolas e alinhamento conceitual dos participantes, as 5 unidades que o representam no Brasil já conseguiram comunicar, á maioria dos professores e estudantes , a importância de se incluir no currículo a dimensão global, por meio de conceitos como direitos humanos, justiça social, diversidade, cultura de paz/resolução de conflitos, sustentabilidade e outros.
Os professores Daniela Lastoria de Godói e Paula Rabello ( Bandeirantes), Eduardo Villalpando, ( EMEF Guilherme de Almeida) , Isa Camargo de Mello, (EE Julia M. Pantoja) , Sueli Nonato (EE Luiza Hidaka) e Sérgio Ferreira , (Teia/Politeia ),que representaram suas escolas em Leeds, compartilharam suas aprendizagens e mostraram as imagens das escolas britânicas visitadas. Contando com a liderança dos diretores , das equipes “Currículo Global” e dos coordenadores do Projeto em cada escola ( Cristiana Assumpção no Bandeirantes, Eduardo Villalpando e Denise Pires na Guilherme de Almeida, Rosmeire Giacomelli na Julia Pantoja, Lucia Hirata na Luiza Hidaka e Georgya Correa na Teia/Politeia), a devolutiva conseguiu beneficiar todos os professores das escolas.
Em várias delas , como no Bandeirantes , os “Viajantes de Leeds” possibilitaram aos colegas vivenciar dinâmicas experimentadas no Reino Unido . Em uma , a Guilherme de Almeida , todos os alunos participaram da elaboração de pôsteres sobre conceitos implícitos na dimensão global, que foram expostos no pátio e visitados por toda a comunidade escolar, inclusive os pais. Os estudantes criaram ainda um vídeo onde refletem sobre a importância de se preservar os espaços da escola, como os banheiros. Em outra , a Julia Pantoja , os estudantes foram envolvidos na criação de um "logo" da unidade para o projeto e os professores trabalharam de forma interdisciplinar , com uma culminância envolvendo atividades de conscientização da comunidade , pelos alunos, sobre comportamentos sustentáveis.. A escola foi convidada a expor no metrô trabalhos dos alunos sobre "casas sustentáveis". Em outra ainda, a Luiza Hidaka, a Feira de Ciências foi toda voltada a ressaltar a dimensão da Sustentabilidade. com alunos apresentando os seus trabalhos sobre o tema . No Bandeirantes , Sustentabilidade e Cidadania estão presentes nas aulas das mais diferentes matérias, de Ciências e Educação Física a Português, onde até a leitura do Frankestein de Mary Shelley pode servir para discutir conceitos como Diversidade e Valores/Percepções . Na Politeia, todas as crianças,independente de idade e presença de deficiências físicas ou mentais, criaram e apresentaram juntas uma peça que incluia muitas dos conceitos Globais - O Mágico de Oz- e realizaram vídeo onde a questão do consumismo era criticada e causas da situação dos moradores de rua eram afloradas.
Conexões internacionais começam a acontecer , com correspondência entre escolas brasileiras e Republica Checa ,Benin, Reino Unido.
4- Cooperação Brasil-África rumo á superação do preconceito e da discriminação:
Conexões internacionais começam a acontecer , com correspondência entre escolas brasileiras e Republica Checa ,Benin, Reino Unido.
4- Cooperação Brasil-África rumo á superação do preconceito e da discriminação:
No momento em que o Brasil emerge como uma das grandes potencias no cenário mundial, é urgente que aprendamos a valorizar as diferenças, a conviver com elas e transformar em mudanças positivas os conflitos que elas provocam . Uma aprendizagem que precisa ser aplicada na escola, na cidade, no país e no mundo , gerando sustentabilidade
O Brasil é exemplo de convivência com a diversidade e de intolerância á diversidade. E um lado, temos a Parada Gay , uma das maiores e mais bonitas do mundo. De outro, sucedem-se abomináveis manifestações de homofobia. De um lado, somos capazes de um sincretismo religioso que concilia o inconciliável, unindo santos da religião católica , baseada na divisão severa entre o bem e o mal e orixás da religião africana onde bem e mal são faces de uma mesma moeda . De outro, o racismo se manifesta na diferença de condições de vida, salários e esperança ao nascer entre cidadãos de pele branca e de pele escura , mostra que a diferença, no Brasil, ainda inferioriza.
A visita de Estudos ao Benin representará para os professores brasileiros, um banho de Africanidade. O pequeno país (menor que Portugal) é hoje um modelo de democracia entre as nações africanas . Nela convivem pacificamente cristãos, islâmicos e praticantes do Vodu, que em iorubá significa Espírito, Deus- religião africana , matriz do Candomblé e da Umbanda brasileiros , distorcida e vilipendiada por Hollywood. O Benin já foi governado por poderosos soberanos autóctones, superou galhardamente o regime colonial francês, viveu duas décadas de um governo autoritário marxista e é herdeiro de tradições culturais, religiosas e artísticas milenares . Berço de escritores como Jean Pliya, e Bhely-Quénum, o Benin, ao receber seus filhos e filhas e além mar , irá contribuir para fortalecer o orgulho e consciência negros nas escolas e comunidades brasileiras .
A Visita de Estudos , da qual também participarão os docentes da Austria, Reino Unido e República Checa, será precedida pela interação entre as escolas brasileiras e as beninesas , localizadas em Porto Novo e Cotonou . São unidades de ensino também muito diversas : Colégio Católico Notre Dame de Lourdes , fundado por missionários franceses, particular, dedicado á formação intelectual e espiritual de seus alunos; Colégio de Ensino Geral de Gbegamey –publico, criado em 1964, de renome nacional , centro de exames e concursos; Complexo Escolar Leopold Senghor ,publico; Complexo Escolar Protestante , particular, criado pela Igreja protestante em 1951;Liceu Toffa (publico) .só de meninas, funcionando desde 1972 .
Ao mesmo tempo, as escolas brasileiras entrarão em contato com os recursos da Casa do Benin , em Salvador .Esse equipamento público , inaugurado em 1988, abriga uma rica coleção de objetos e obras de arte da região do Golfo do Benin, de onde veio a maioria dos negros que povoaram o Recôncavo Baiano. A maior parte do acervo foi colecionada pelo antropólogo fotógrafo e cidadão planetário Pierre Verger ,em suas andanças pelo continente africano . Uma professora da EMEF Guilherme de Almeida aproveitou as férias na Bahia para visitar a Casa e, consultar sua biblioteca especializada em África e Cultura Afro-Brasileira , recolhendo materiais e contatos para todos os colegas do Projeto Currículo Global para a Sustentabilidade.
Conclusão
Os educadores envolvidos no projeto Curriculo Global para a Sustentabilidade no Brasil estão construindo ferramentas para que as escolas e comunidades possibilitem às crianças e adolescentes compreender como injustiças do passado afetam as políticas contemporâneas locais e globais, identificar interconexões entre as esferas sociais, econômicas e ambientais, perceber que as pessoas, lugares, economias e ambientes estão todos intrinsecamente relacionados, e que escolhas e eventos locais tem repercussão em escala global . Esses educadores convidam ,os estudantes, por meio de suas situações de aprendizagem cuidadosamente planejadas , a desafiar o racismo e outras formas de discriminação, desigualdade e injustiça, percebendo que somos todos parte de uma só humanidade, que a força do Axé nos une e que o sofrimento ou a felicidade de um, impacta a comunidade inteira.
Trata-se de um projeto que conta com recursos financeiros muito limitados. Os profissionais da Educação nele engajados estão sendo movidos por valores e princípios alternativos- altruístas , solidários . Também pelo prazer gratuito de cooperar e aprender com o outro, com o diferente. Eles remam a favor do futuro , rumo às praias da democracia planetária que nossos bisnetos talvez alcancem.
Muitos parceiros já se juntaram a nós. Desde o início do processo, o CECIP vem contando com a generosa e gratuita consultoria de especialistas como Angela Antunes e Erick Morris, do Instituto Paulo Freire, Helena Singer, do Instituto Politeia, Monica Mumme ,de seus próprios quadros - além do apoio de Vilma Guimarães, da Fundação Roberto Marinho. Você também pode remar conosco. Afinal, cada um de nós é o que é por aquilo que todos somos : Ubuntu. .
(1)- CECIP- Coordenadora Pedagógica e Coordenadora Administrativa do Projeto Currículo Global para a Sustentabilidade no Brasil
(2) Diretor Executivo do CECIP; Professora de Português- EMEF Guilherme de Almeida e Professor de Artes. EE Julia M. Pantoja , membros da equipe Brasileira do projeto Currículo Global para a Sustentabilidade.
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